29 abril, 2010

Lula celebra Geisel em Belo Monte

Por Demétrio Magnoli


          Belo Monte lembra Itaipu, de muitas formas. O estudo de viabilidade da usina, então batizada Kararaô, começou em 1980, durante a construção de Itaipu. O nome do general-presidente Ernesto Geisel está ligado às duas obras. Itaipu nasceu do consórcio binacional firmado um ano antes de sua posse, mas tornou-se um ícone do modelo de desenvolvimento que ele personificou. O conceito original de Kararaô foi elaborado durante o seu quinquênio, como parte de um grandioso plano de exploração do potencial hidrelétrico da Amazônia. De Kararaô a Belo Monte, mudou a abordagem dos impactos sociais e ambientais do projeto. Por outro lado, a engenharia financeira da hidrelétrica, tal como exposta no seu leilão, evidencia a restauração da visão geiseliana sobre o Brasil.
          Lula definiu Geisel como "o presidente que comandou o último grande período desenvolvimentista do País". A crítica ao desenvolvimentismo geiseliano não partiu dos liberais, então um tanto calados, mas da esquerda. As grandes obras de infraestrutura de sua época foram financiadas à custa do endividamento estrutural do Estado e pagas ao longo de mais de uma década de inflação. No preço oculto das variadas Itaipus, esses objetos do encantamento de Lula, deve-se contar a crise política crônica que destruiu o regime militar e envenenou os governos Sarney e Collor tanto quanto a impotência do Estado para investir em serviços públicos de saúde e educação. Tais lições, aprendidas na transição política que viu nascer o PT, são hoje renegadas, no discurso e na prática, por um presidente embriagado de soberba.
          Geisel ofereceu energia barata para a indústria, subsidiando-a pela via da exclusão social de milhões de brasileiros. Uma ditadura comum pode fazer isso por algum tempo, mas é preciso uma ditadura à chinesa para sustentar tal estratégia de desenvolvimento. Kararaô não seguiu adiante pois esgotara-se o fôlego financeiro e político do modelo de Geisel. Desde a redemocratização, sob pressão dos eleitores, os governos iniciaram um redirecionamento dos fundos públicos para as finalidades sociais. O leilão de Belo Monte representa uma inflexão nessa curva virtuosa.
          A engenharia financeira da usina se subordina ao dogma geiseliano da tarifa barata. O suposto benefício não passa de um subsídio indireto aos empresários industriais e comerciais, que consomem juntos quase 70% da oferta total de eletricidade. A tarifa comprimida afugentou os investidores privados, convertendo o Estado no financiador principal da obra. O BNDES entrará com 80% dos recursos, a juros subsidiados e prazo de pagamento de 30 anos. Como o BNDES não dispõe desse capital, o Tesouro pagará a conta, emitindo dívida pública.
          O preço real da eletricidade que será produzida, escondido atrás da tarifa de mentira, corresponde à remuneração do capital investido na obra, mais os custos e lucros da concessionária. A diferença entre o preço real e a tarifa recairá sobre os brasileiros de todas as faixas de renda, inclusive sobre a geração que ainda não vota. Itaipu, segunda versão: apesar daquilo que dirá a candidata governista no carnaval eleitoral, o povo fica condenado a subsidiar a energia consumida pelo setor empresarial.
          Lula celebra Geisel no templo profano do capitalismo de Estado. Contudo, se o general confinava as empresas parceiras à lucrativa função de empreiteiras, o presidente que o admira prefere o sistema de aliança no consórcio concessionário. O jogo, mais complexo, assumiu a forma de uma contenda entre aliados pela distribuição de poder e benesses financeiras. À sombra da regra da tarifa subsidiada, manejando os recursos públicos e o capital dos fundos de pensão, que trata como se fossem públicos, o governo impôs o controle estatal sobre o consórcio.
          A Eletrobrás, imaginada como uma Petrobrás do setor elétrico, terá a hegemonia na operação da usina, pela via da participação de 49,98% da Chesf no consórcio vencedor. À meia luz, no ambiente propício aos acertos heterodoxos, desenvolve-se o processo de domesticação dos parceiros privados, que aceitarão posições subordinadas em troca de generosas isenções tributárias e da almejada participação como empreiteiros. O leilão foi apenas o ponto de partida da negociata multibilionária, que seguirá seu curso longe dos olhos da opinião pública.
          A nova Itaipu custará estimados R$ 30 bilhões. Na sequência, vem aí o leilão do trem-bala, com custo similar, também financiado essencialmente por meio de emissão de dívida pública. O PT nasceu no ano da concepção de Kararaô e no rastro da crítica de esquerda ao peculiar nacionalismo geiseliano, com a sua aliança entre o Estado-empresário e uma coleção de grandes grupos privados associados ao poder. Três décadas depois, é no capitalismo de Estado que ele busca um substituto para a descartada utopia socialista.
"No Brasil dos generais, quem quisesse crescer tinha de ter uma relação de dependência absoluta com o setor público", explicou um alto executivo da construtora Norberto Odebrecht, que participou da fase derradeira da construção de Itaipu. O fundador da empresa mantinha relações estreitas com Geisel. Seu neto, Marcelo, atual presidente da Odebrecht, conserva uma coerência de fundo com as ideias do avô. É essa coerência que o levou a afirmar, três meses atrás: "O Chávez tem vários méritos que o pessoal precisa reconhecer. Antes dele, a Venezuela estava de costas para a América do Sul e de frente para os EUA. Vocês podem questionar o que quiserem, mas é inequívoca a contribuição que Chávez deu à integração do continente americano. É inequívoco, também, que os objetivos são nobres."
          Marcelo Odebrecht pode ou não ter objetivos "nobres", mas não é ingênuo nos negócios - nem em política. A Odebrecht negocia a sua incorporação ao consórcio de Belo Monte. Ela tem bilhões de motivos para gostar do capitalismo de Estado.

In Memorian

Por Ruben Figueiró

Éramos cinco: Mustafa Ale Esgaib, Ubaldo Baren, ambos de Ponta Porã, Nelson Mendes Fontoura, de Coxim, Nelson Trad, de Aquidauana e eu, de Rio Brilhante, cidades das quais descendemos. Estudantes universitários na (então) maravilhosa  cidade do Rio de Janeiro, todos idealistas, cheios de sonhos e um desejo turbilhonado para voltar ao nosso Mato Grosso e nele ao torrão querido que nos recebera, a Cidade Morena. Mustafa, ainda muito jovem, Deus o levou; Ubaldo percorreu longa e brilhante trajetória como advogado, promotor e procurador de justiça, deputado estadual e federal, também teve a mesma sorte deixando-nos com sua inefável lembrança, anos atrás.
Nelson Mendes Fontoura, o nosso “coronel”, como carinhosamente o chamávamos, entre nossas imensas saudades acaba de partir para o berço eterno do Senhor. Tanto Nelson Trad (tenho absoluta convicção) quanto eu, sempre e sempre, teremos em nossas memórias a fisionomia do insigne homem emoldurado na pessoa do Nelson Fontoura. Amigos sinceramente fraternos mercê a uma convivência de mais de cinco décadas, somos testemunhas da marcante personalidade do saudoso amigo. Nos tempos da Faculdade de Direito do Rio de Janeiro (o famoso Casarão do Catete), da então Universidade do Distrito Federal, por cinco anos fomos parceiros de bancada em salas de aula e das tropelias que nossos impulsos políticos nos levaram à defesa dos ideais cada vez mais fervorosos  do que acreditávamos pelo bem do Brasil e do nosso Sul de Mato Grosso.
Fontoura e eu lutávamos nas trincheiras da UDN e, com os olhos voltados para a nossa terra pela empolgante luta da divisão do Estado, isto dentro da AME (Associação Mato-grossense de Estudantes) – entidade que no Rio de Janeiro reunia a juventude estudiosa do Estado, radicada na cidade maravilhosa, e da qual fomos presidentes. O Trad, de sua parte, assumiu com o ardor pelo seu PTB, autentico trabalhista que era, a UME (União Metropolitana de Estudantes) aguerrida entidade na defesa da juventude universitária e que deu alguma “dor de cabeça” ao governo do presidente Juscelino Kubstichek. Nós cinco, Mustafa, Ubaldo, Fontoura, Trad e eu, sempre unidos nas lutas pelas quais acreditávamos, chegamos até a enfrentar os cassetetes da famosa e violenta Polícia Especial do Governo Federal (conhecida pelos quepes vermelhos que usava), para não esquecer jamais.
Voltemos ao nosso aprisco natural. Advogados, em 1958, com a nossa presença em Campo Grande, somavam dezenove profissionais em efetiva atividade, tomando cada um rumos diferentes na procura de não desmerecer a nossa formação universitária e os nossos ideais democráticos. Aqui ressalta a figura do Nelson Mendes Fontoura. Após exercer o mandato de deputado estadual, como representante de sua região natal (Coxim, Rio Verde e Pedro Gomes), convidado pelo então governador, e excepcional cidadão, Fernando Correa da Costa,  aceitou o cargo, e, difícil também na ocasião, o encargo de promotor de justiça da Comarca de Campo Grande. Tal foi o seu desempenho onde prevaleciam os ditames maiores da cidadania, com a criação do Estado de Mato Grosso do Sul, foi natural a sua ascendência ao alto cargo de procurador chefe do Ministério Público; foi secretário de justiça e, culminando brilhante carreira, tornou-se desembargador do Tribunal de Justiça e seu presidente. Profícua e bela a carreira do querido Nelson Fontoura, reconhecimento testemunhado pelas lágrimas de saudades de todos quantos acompanharam as suas exéquias.
Nelson Mendes Fontoura nos legou memoráveis exemplos de dignidade pessoal, fidelidade aos princípios que trouxe de seus progenitores, amor a sua esposa Nice, aos seus filhos, noras e netos e extrema lealdade e companheirismo a todos, como nós sobreviventes –  Trad e eu, que jamais olvidarão.

28 abril, 2010

Myspace do Dino Rocha

          Criei o Myspace pro meu amigo e renomado instrumentista, Dino Rocha. Para quem não conhece, o Dino é um acordeonista com mais de 40 anos de carreira, tendo lançado uma série de discos e cd's, e trabalha com o estilo musical chamamé. O chamamé é muito popular no norte da Argentina, especialmente em Corrientes, bem como no Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul; é um ritmo de fronteira, oriundo da bacia do Prata e parecido com a polca paraguaia. Com relação ao Dino, só pra constar, ele já participou da lendária novela Pantanal, além de ter gravado com vários artistas de expressão nacional, tais quais Almir Sater e Chitãozinho & Xororó.
          Enfim, é isso, espero que entrem, apreciem, comentem e divulguem. O endereço é http://www.myspace.com/dinorocha .

27 abril, 2010

Série - Ricardo Eletro

          Após 21 dias, eis que a minha geladeira encomendada junto à loja Ricardo Eletro chegou. A questão a qual eu devo me perguntar é a seguinte: diante de tamanho atraso, devo buscar alguma reparação? Verificarei ainda esta semana as minhas possibilidades junto a um advogado, e pelo que pesquisei no site "Jurisprudência", sim, neste caso parece-me que cabe um processo. Diante desta situação, inicio no blog uma série que tem como objetivo, num caso simples, relatar minhas impressões sobre o sistema judiciário brasileiro.
          Levantarei as seguintes questões: (1) vale a pena buscar os meios jurídicos, ou não? Quando? (2) Quais os maiores problemas do setor, neste caso? Postarei aqui as minhas constatações e críticas, deixando-os a par de tudo o que acontecer durante esta minha luta. Aguardemos os pareceres...

The Sound of Rio - Elza Soares

Que dia é hoje - Samuel Morse

          Hoje comemora-se o aniversário de nascimento de um dos maiores inventores no ramo das comunicações de todos os tempos, o norte-americanos Samuel Morse. Nascido em 1791, no estado de Massachusetts, aos quatro anos já mostrava grande interesse pelo desenho e, aos catorze, ganhava o seu próprio dinheiro fazendo desenhos de seus amigos e pessoas. Ainda na época de colégio, escreveu uma carta aos pais dizendo que queria se tornar um pintor. Os pais, preocupados com o futuro do filho, preferiram transformá-lo num vendedor de livros. Desse modo, Morse passou a vender livros de dia e a pintar à noite. Ante a persistência do artista, os pais decidiram mandar o filho para Londres para que estudasse artes na Royal Academy.
          Estudou no Yale College, interessando-se pela eletricidade, ainda pouco compreendida na época, e pela pintura de retratos em miniatura. Estudou pintura na Inglaterra e, ao voltar aos Estados Unidos, fez retratos considerados obras-primas do gênero.
          Ganhou notoriedade com a invenção do telégrafo elétrico e criação do sistema de sinais conhecido como código Morse, que tornou mais eficiente a comunicação por telegrafia. O sistema utiliza uma combinação de pontos, traços e pausas para transmitir informações por meio de impulsos telegráficos ou visuais. Em 1843 utilizou o método para construir a primeira linha telegráfica, que ligaria Baltimore a Washington.
          No ano seguinte transmitiu a primeira mensagem: "What hath God wrougth!" (Que obra fez Deus!). Morreu rico em Nova York. Sua fortuna foi fruto proliferação de linhas telegráficas nos EUA

Fonte: algosobre e Wikipedia (adaptados)

26 abril, 2010

Respeito em abandono

          Pichado foi o símbolo do Brasil, tal qual um pecador identificado! Com assinaturas e inscrições de protestos, nossa nova maravilha do mundo assim amanheceu, tatuada de provocações em forma de tinta. É o fim do Rio? O começo do fim? Não, é somente um exemplo de como nós, brasileiros, respeitamos nossos símbolos e instituições.
          Só pra constar, em pleno feriado último, diversos cartões-postais do Rio também mostravam sinais de abandono: na Marina da Glória, com o esplendor da Guanabara ao fundo, juntavam-se uma barraca com seus moradores (de rua, agora Baía); no Corcovado, a linha férrea que dá acesso à "redenção", encontrava-se interditada em função dos deslizamentos; no Centro e por toda a parte, juras de amor, estampas de guetos e  outros mais estavam representados em forma de piche. Até quando? Até quando a tua liberdade e o teu direito de ir e vir, sufocam e vão de desencontro à vida minha? Transgressão é coisa feia, e desrespeito, em quaisquer níveis e lugares, seja em casa ou na faculdade, com gestos ou palavras, é deplorável. E tem mais... pior do que a transgressão, é a permissividade desta, acrescentada à inexistência de bons exemplos dada por aqueles que regulam a sociedade. Isto é feito pelo estado brasileiro; ele não fiscaliza e pune, apenas disfarça arranjando bodes expiatórios
          O Brasil tornou-se um país sem referências, sem exemplos e infelizmente o desrespeito tomou seu lugar num ciclo contínuo. A moralidade e o civismo deram lugar à impunidade e à exaltação da malandragem. A passividade da classe média, que deveria formar opiniões, alcança a estratosfera! É egoísta, preguiçosa... prefere pagar planos de saúde, escolas e impostos, reduzindo-se aos comodismos e individualismos paralisantes, ao invés de cobrar, protestar, MELHORAR.
          Precisamos buscar referências, espelhando-nos no bom passado, adaptando ilibáveis condutas de outrora para o presente, com o intuito de construir um melhor futuro.
Quando o homem aprender a respeitar até o menor ser da criação, seja animal ou vegetal, ninguém precisará ensiná-lo a amar seus semelhantes. (Albert Schweitzer)

Hora de despertar

Extraído do editorial do jornal O Globo, artigo escrito por Paulo Guedes.

          A candidata verde Marina Silva desaprova o bloqueio às aspirações eleitorais de Ciro Gomes, e considera sua retirada da corrida eleitoral "uma perda para a democracia e para o processo político".           Tenho a mesma opinião. Mais do que um concurso de beleza entre tucanos e petistas que se repete há quatro mandatos presidenciais, os eleitores se beneficiariam das críticas e do desconforto de Ciro com as práticas políticas convencionais, que nem FHC nem Lula ousaram reformar.           "É preciso questionar práticas que parecem inevitáveis. É preciso criticar todas as tradições políticas, quando se sabe que tanto a esquerda como a direita são obsoletas. É preciso recuperar princípios morais perdidos, pois sem eles continuaremos todos perdidos...", adverte Susan Neiman, em "Clareza moral: um guia para idealistas maduros" (2009).           A reabilitação moral de nossas instituições exige o debate de uma reforma política durante a campanha eleitoral que se inicia. O deslocamento de Ciro pela direção do PSB, sob a suposta orientação do presidente Lula, não impedirá a discussão de um tema cuja hora chegou. Ou melhor, que há muito já passou.           Além da inadiável questão ética, há também o problema da eficiência operacional em nosso processo político. Os programas de investimento do pré-sal permanecem à espera de definições no marco regulatório. As dificuldades na atração de investidores para o projeto da usina hidrelétrica de Belo Monte foram evidentes. Necessitamos de investimentos maciços públicos e privados em educação. E, sem uma reconfiguração da política fiscal, já recaímos no samba anti-inflacionário de uma nota só: os juros voltam a subir.           Há uma nova ordem econômica em formação no globo. A classe política europeia começa a perceber, com o drama da Grécia, que o mundo não é mais o mesmo. Um exame superficial sugere que o problema é do euro. Mas, na verdade, trata-se da falta de fundamentos econômicos sustentáveis na social-democracia grega. Aliás, os excessos da social-democracia europeia apenas começam a ser purgados. Como prosseguirão também em agonia os contribuintes anglo-saxões, em decorrência dos excessos cometidos por seus bancos centrais e financistas.
          A besta do capitalismo eurasiano está solta, esculpindo a nova ordem. Politicamente reprimida em casa, mas economicamente desimpedida para virar o mundo de cabeça para baixo. Hora de despertar.

24 abril, 2010

A saída de Ciro e o retrocesso democrático

Da senadora Marina Silva (PV-AC), candidata à sucessão de Lula, em seu site.

          Qual o sentido político da democracia? É a liberdade de escolha bem informada. Numa eleição em dois turnos, como a presidencial, o primeiro foi concebido para oferecer ao eleitor um leque de alternativas políticas. A partir da diversidade de idéias e do debate entre elas, compete ao cidadão escolher as que entende serem as melhores para si e para o país.
          É particularmente perverso que esse processo, que está no cerne da democracia, seja instrumentalizado para impedir abalos na manutenção de projetos de poder. Não é admissível que se queira manipular o direito de escolha por meio da redução forçada do leque de opções.
          Assistimos agora, com o veto à candidatura de Ciro Gomes, uma expressão exemplar desse tipo de intolerância democrática. É fácil prever que os mesmos grupos que trabalharam para tirar Ciro da disputa presidencial tentarão agora assimilá-lo.
          Os que costumam agir dessa maneira são aqueles que têm dificuldade em transformar a visão democrática em ação e não admitem a alternância de poder. Primeiro, buscam eliminar os adversários que querem disputar legitimamente a preferência dos eleitores. Depois, tentam se colocar como o único hospedeiro possível para que os expurgados consigam sobreviver na vida pública.
          Aquele que foi empurrado para fora do processo passa então a ser apontado como bom companheiro, patriota, desde que aceite ser assimilado por aqueles que articularam o seu expurgo.
Perde o país, perde a democracia.

23 abril, 2010

Que dia é hoje - Pixinguinha

          Alfredo da Rocha Viana Filho, mais conhecido como Pixinguinha, completaria hoje seus 113 anos, se vivo estivesse. Foi flautista, saxofonista, compositor e arranjador e é considerado um dos maiores artistas da música popular brasileira, contribuindo diretamente para que o choro encontrasse uma forma musical definitiva. Dentre os seus maiores sucessos estão "Carinhoso" e "Lamentos", sendo que a primeira, na época, foi considerada uma polca, e não um choro. 
          No dia 23 de abril, em homangem ao Pixinguinha, comemora-se o Dia Nacional do Choro. A data foi criada oficialmente em 4 de setembro de 2000, quando foi sancionada lei originada por iniciativa do bandonilista Hamilton de Holanda e seus alunos da Escola de Choro Raphael Rabello.
          Pixinguinha faleceu aos 76 anos na igreja Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, na cidade do Rio de Janeiro, deixando legião de fãs, amigos e admiradores por todo o mundo.

Eu acho que...

          Realmente, foi um absurdo o caos que instalou-se em boa parte da Zona Sul do Rio nesta última quarta-feira (21), em virtude da realização de um mega-show para mais de 1 milhão de pessoas na Enseada de Botafogo. O evento havia sido comunicado com muita antecedência à prefeitura, e esta o autorizou sem resguardar os moradores dos prováveis tumultos. Os resultados disso foram inúmeros problemas, dentre eles um trânsito caótico, dezenas de toneladas de lixo acumulado e diversos serviços interrompidos, sem falar na desordem e balbúrdia que reinaram durante todo o dia.
          O que aconteceu vai de total desencontro ao que foi o mote de campanha, e até de governo, do prefeito Eduardo Paes: a ordem pública. Paes prometera ser um síndico da cidade, criou a secretaria de Ordem Pública para cuidar dos pequenos e grandes problemas de todo o Rio, dando especial atenção ao combate à ilegalidade. Todavia, há de se constatar que o lema não passou de mera publicidade, com combates que não duram e só cabem bem em fotos e discursos, porque na prática os resultados são pífios, nulos.
          Com relação à última quarta, resta à população cobrar da prefeitura maiores explicações sobre a sua ausência neste evento, porque o correto seria levar todo um aparato formado por guardas municipais, guardas de trânsito, policiamento e orientando ao mesmo tempo antecipadamente os moradores da cidade sobre o tumulto pontual, para que assim o trânsito fosse desviado, etc.
          Se não existem condições para algo deste porte, imaginem só, com Copa e Olímpiadas? Se a cidade não estiver preparada, não haverão condições, haverá sim, humilhação e desastre, e com platéia!

Falta ação política na saúde

Extraído do editorial do jornal O Globo, artigo escrito por Roberto Luiz D'Avila.

          Estudo realizado e divulgado recentemente pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) mostra que, aocontrário do que se pensa, não escassez de médicos no Brasil. Pelo contrário, os números indicam que o volume de profissionais da categoria cresceu, percentualmente, quase o dobro que o total da população brasileira durante o período de 2000 a 2009.
          Ao longo desses anos, a quantidade de médicos em todo o país aumentou 27% — de 260.216 para 330.825 —, enquanto a população brasileira cresceu 12%—de 171.279. 882 para 191.480.630. Atualmente, no Brasil, um médico para cada grupo de 578 habitantes. Em 2000, essa relação era de um profissional para 658 habitantes.
          Se considerássemos apenas esse acréscimo proporcional do número de médicos, poderíamos concluir que a possibilidade de acesso à assistência clínica estaria a caminho dos padrões dos países mais desenvolvidos dodo. Contudo, isso não é verdade. Infelizmente, a análise dos dados revela a cruel realidade da distribuição dos médicos pelo território nacional.
          concentração de 72% dos médicos em atividade nos estados das regiões Sul e Sudeste; e a maioria dos profissionais restantes está estabelecida no litoral e nas capitais. No Rio de Janeiro, por exemplo, , noerior do estado, um médico para cada grupo de 598 habitantes; na capital, um profissional para 172 habitantes.
          Se é verdade que unidades da federação que apresentam uma proporção digna de indicadores europeus, como o Distrito Federal (um médico por 287 habitantes), também é verdade que outras nas quais a relação se aproxima daquela se quenos países mais pobres do mundo. É o caso de Roraima, onde, no interior, um médico para cada grupo de 10.386 habitantes.
          Mas por que o médico não se fixa nos municípios mais carentes ou fora das áreas de desenvolvimento? A resposta é simples: pela falta de políticas públicas efetivas que reconheçam a importância do médico e dos outros profissionais da saúde, que lhes ofereçam salário adequado, possibilidades de formação continuada, um plano de crescimento profissional e condições dignas de trabalho.
          Sem essas garantias mínimas, o médico sempre terá dificuldades de criar raízes, exercer com tranquilidadee, assim, contribuir para o desenvolvimento humano de uma comunidade. O que assistimos é um fluxo irregular. Mesmo aqueles que assumem o desafio de ir para o interior muitas vezes desistem mal dados os primeiros passos.
          Com vínculos empregatícios frágeis ou ausentes, sem possibilidade de se aperfeiçoar e convivendoente com a inexistência de infraestrutura para garantir o atendimento, o médico (jovem ou veterano) não vê outro caminho a não ser voltar ao seu ponto de partida. São vítimas da precarização do trabalho.
          Sofrem os profissionais, que não têm chances de exercer sua profissão adequadamente, e sofre a população, privada do direito constitucional de receber a devida assistência em saúde. O país precisa urgentemente de soluções que garantam a interiorização da medicina. E isso não significa colocar um médico em municípios carentes munido apenas de seu estetoscópio. É fundamental construir uma nova realidade, sob pena de comprometer avanços assistenciais alcançados pelo SUS nas últimas décadas.
          Embalado por diretrizes que o tornam referência internacional, o Sistema Único de Saúde, criado em 1988, sofre com sua inconclusão, caracterizada pela enorme distância de seu escopo teórico em relação aoestrangulamento das emergências e aos vazios assistenciais. Assim, para garantir que o modelo ganhe vida plena, é preciso uma ação política urgente.
          Em primeiro lugar, para assegurar uma fonte de financiamento estável para o SUS. A regulamentação da Emenda Constitucional 29, que anos se arrasta pelo Congresso Nacional, necessita do engajamento doerno e da união de forças políticas que a levem a sua aprovação definitiva. Apenas com a garantia de investimentos e recursos será possível ampliar a rede, equipá-la e assimilar os avanços proporcionados pela modernidade tecnológica.
          Mas que se olhar também para o profissional, para o médico que atende no posto de saúde ou nono campo ou na cidade. Com a criação de uma carreira de Estado para estes profissionais, em modelo semelhante ao adotado pelo Poder Judiciário e pelo Ministério Público, seria possível garantir o cuidado a todos os cantos do país. Sobre esse tema, uma proposta em trâmite no Congresso sob a forma de emenda constitucional, que tem sido discutida de forma favorável dentro do Ministério da Saúde. Ela implica um aperfeiçoamento profundo da política de recursos humanos no SUS. Por um lado, ela estabeleceeis com as exigências do trabalho. Por outro, dá ao médico ingressado que pertença à carreira condições de se desenvolver profissionalmente e exercer com qualidade seu mister. Aqui, mais doe de proventos, falamos de acesso a programas de formação médica continuada, infraestrutura de trabalho (instalações e equipamentos) e uma rede integrada capaz de absorver os casos mais graves. Enfim, é uma mudança de paradigma que beneficiará toda a população, ao garantir-lhe a presença de um profissional qualificado e aparelhado para prover a tão esperada assistência.
 
Roberto Luiz D'Avila é presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM).

22 abril, 2010

Encanto não se transfere

EDIÇÃO ESPECIAL DA REVISTA VEJA
Como foram os melancólicos (mas nem tanto) últimos dias do Rio de Janeiro como sede do governo
Sérgio Rodrigues
Foto: Aliam Milan/Agência Tyba
Noite ilustrada
À porta do Teatro Municipal, em noite de gala, o chofer do Simca Chambord à espera
dos passageiros
Rio de Janeiro - 3 | 3 | 1959
          No dia 21 de abril de 1960, o último do Rio de Janeiro como capital da República, dois de seus principais cronistas – nenhum deles carioca de nascimento, o que era típico de uma metrópole que se pretendia a "síntese do Brasil" – viveram experiências opostas. O capixaba Rubem Braga se desgarrou dos amigos que iam conferir o desfile das escolas de samba na Avenida Rio Branco, um evento sintomaticamente bagunçado, promovido sem dinheiro e com escassez de policiamento pelo Departamento de Turismo da prefeitura para comemorar o nascente estado da Guanabara. Depois de ver no Leme os fogos de artifício que saudaram a meia-noite, Braga entrou solitário numa boate e, ao sair, constatou melancolicamente que a lua minguante era agora uma "lua estadual".
          Naquele momento, o pernambucano Nelson Rodrigues estava longe de tudo isso – do Rio e da melancolia –, em plena festa de inauguração de Brasília, esta sim uma comemoração rica, financiada por um "crédito especial de Cr$ 150 milhões", como noticiou na primeira página o jornal antibrasiliense Tribuna da Imprensa. Contrariando sua lendária aversão a viagens, Nelson tinha aceitado carona num dos ônibus que o Centro de Preparação de Oficiais da Reserva (CPOR) – onde um de seus filhos prestava serviço militar – alugara para levar oitenta estudantes secundaristas aos festejos. A caravana saiu do Rio no dia 20 para uma desconfortável viagem de vinte horas. Em troca da hospedagem no Planalto Central, o maior dramaturgo brasileiro negociou enviar para o jornal Última Hora, de Samuel Wainer, uma crônica a ser publicada no dia 22, o primeiro da Federação redesenhada.
          O cisma aberto em sua elite cultural deixa claro que o Rio de Janeiro chegou aos últimos momentos de seus 71 anos como capital da República – e dos 197 desde que se tornara sede da colônia, em 1763 – imerso em confusão. Uma confusão construída paralelamente ao trabalho dos candangos, crônica por crônica, samba por samba, conversa por conversa, pelo menos desde o início de 1957, quando começou a ficar evidente até para os céticos que Juscelino Kubitschek não estava brincando ao dizer que levaria a capital embora. Aquilo seria bom para o Brasil, mas ruim para a cidade? Um desastre para ambos? Excelente para todos, com exceção dos barnabés? O Rio, agora autônomo, ganharia mais atenção de seus governantes? Brasília dividiu os brasileiros em duas facções, a dos "mudancistas" e a dos "antimudancistas". Era natural que a capital preterida fosse palco das principais batalhas.
Quem não chora não mama
Havia muita reclamação, mas a população do Rio aceitara Brasília – Ibope*
80% acreditavam que JK tinha acelerado o desenvolvimento brasileiro
73% aprovavam a mudança da capital
62% acreditavam que a nova capital traria benefícios ao país
24% desaprovavam a iniciativa
* Pesquisa realizada em março de 1960
          Não se tratava de mera rixa de literatos. A novidade de concreto armado que brotara em tempo recorde no meio de Goiás era um ímã de aventureiros em busca de enriquecimento rápido, mas deixava apavorados os funcionários públicos federais habituados à vizinhança da praia e ao consumo elegante na Galeria Menescal – destes, apenas 1,1% tinha sido transferido para Brasília a tempo da inauguração. Políticos amotinados ameaçavam criar um Senado paralelo no Rio, alegando falta de condições de trabalho na Novacap. Na área da cultura popular, o racha ganhou corpo nos sambas antípodas de Billy Blanco e Ataulfo Alves. O primeiro, que em 1957 chegou a ter sua execução proibida extraoficialmente na Rádio Nacional, apregoava que, por não ser "índio nem nada", não iria para Brasília, "nem eu nem minha família". O segundo rebuscava a rima com o nome da nova capital para tomar o rumo oposto: "Levo comigo Conceição e Dorotília / violão e tamborim. / Vou fazer samba em Brasília".
          A imprensa guardou os melhores registros da briga. O título da crônica que pagou a hospedagem de Nelson Rodrigues em Brasília – e que mereceu chamada de primeira página na Última Hora – era "A derrota dos cretinos". Não foi Rubem Braga o alvo escolhido pelo autor entre os antimudancistas que, sobretudo no Rio e em São Paulo, pululavam na imprensa e nos meios políticos – estes puxados pela retórica inflamada do udenista Carlos Lacerda, dono da Tribuna da Imprensa e líder das manobras que haviam tentado impedir JK de tomar posse. "A derrota dos cretinos" fazia mira no poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade, outro carioca de adoção, que em uma crônica no Correio da Manhã tinha criticado a poeira vermelha do Planalto Central. Em transe épico – o mesmo que o levara a declarar que, "a partir de Juscelino, surge um novo brasileiro" –, Nelson imaginou o dia em que veria Drummond num canteiro de obras da nova capital, "dando rijas e sadias marteladas".
          Havia mudancistas mais sóbrios. O escritor paraibano José Lins do Rego defendia a tese corriqueira de que o governo federal precisava se isolar dos "problemas locais" de uma grande cidade. Os antimudancistas também tinham colorações variadas. Enquanto o maranhense Josué Montello lamentava a partida das autoridades federais, "grandes figuras que se ajustavam à importância" do relevo carioca, Rubem Braga mal disfarçava o despeito ao prever que "pelo menos no caráter" faria bem ao Rio a migração da "fauna mais graúda dos animais de rapina" para o Planalto Central. O ciúme era tão disseminado que chegava a ser explícito no texto publicado por David Nasser na revista O Cruzeiro de 7 de maio de 1960: "Obrigado, Juscelino, por haveres trocado esta cidade por uma paixão recente. O Rio te agradece por Brasília, a noiva que preferiste a um velho amor".
          Café society. Tratava-se, porém, de um ciúme temperado por autossuficiência. Ao mesmo tempo em que listava as mazelas urbanas que poderiam ter sido resolvidas pelos dutos de dinheiro canalizados para Brasília – falta de água crônica, enchentes, trânsito engarrafado, favelização –, a imprensa da cidade fazia variações sobre o tema "Encanto não se transfere", ilustrado por uma foto da Praia de Copacabana no Jornal do Brasil de 21 de abril de 1960. O "encanto" não englobava pouca coisa. O Rio acabava de adicionar mais um tijolinho ao edifício de sua fama internacional com o sucesso do filme Orfeu Negro, de Marcel Camus, Palma de Ouro em Cannes. Exportava para o resto do Brasil, via colunismo social e revistas de grande vendagem como O Cruzeiro e Manchete, um espetáculo de boa vida e elegância conhecido como café society e simbolizado pela sofisticação da boate Sacha’s, frequentada até por JK. E embalava tudo isso na batida da bossa nova, produto de sua classe média praiana, que naquele ano de 1960 venderia nos Estados Unidos mais de 1 milhão de cópias de Samba de Uma Nota Só e Desafinado. Como poderia o Peixe Vivo competir com aquilo? "Espírito e coração do Brasil", pontificou o Correio da Manhã em editorial, "continuamos sendo nós."
          JK, político hábil, tratou de afagar esse orgulho na despedida. No programa de rádio Voz do Brasil de 19 de abril de 1960, mandou um recado à cidade, dizendo que seus "centros de cultura prosseguirão jorrando a luz que dirige a marcha do Brasil para o seu grande destino". No dia seguinte, ao descer a escadaria do Palácio do Catete pela última vez, derramou algumas lágrimas. E no fim tudo acabou em festa popular, com "centenas de milhares de pessoas" (a conta é do jornal O Estado de S. Paulo) tomando "a Avenida Rio Branco, Largo da Lapa e vias adjacentes". À meia-noite do dia 20, o samba deu lugar a um buzinaço e à marchinha Cidade Maravilhosa, recém-transformada em hino da Guanabara. Na guerra ruidosa entre mudancistas e antimudancistas, entre a ciumeira e a euforia, não sobrara espaço para uma reforma institucional que equacionasse o futuro político e econômico de uma cidade desabituada de ser província. Quarenta anos depois, com amargura, o economista Carlos Lessa anotaria no livro O Rio de Todos os Brasis: "O Rio cedeu os direitos de primogenitura em troca de um prato de lentilhas". Deu-se parte da recuperação da autoestima carioca em 2 de outubro deste ano, quando a cidade foi anunciada como sede da Olimpíada de 2016. "O Rio é uma cidade que perdeu muitas coisas ao longo da história", disse o presidente Lula. "Foi capital, foi coroa portuguesa, e aparece nos jornais em notícias ruins. É hora de retribuição a um povo maravilhoso."
Foto: Arquivo Nacional
Foto: Peter Scheier/Instituto Moreira Salles
A saída...
Caminhão de mudança leva móveis e papelada
do Palácio Monroe, sede do Senado no Rio
Rio de Janeiro - 5 | 4 | 1960

...A chegada
Desolação do funcionário público no cenário
seco do novo Distrito Federal
Brasília - 1960


Foto: Peter Scheier/Instituto Moreira Salles
Solidão
Apenas 1,1% dos funcionários
públicos federais trocou o litoral
pelo cerrado nos primeiros dias
da mudança

Brasília - 1960



A rixa dos cronistas
Camilo Calazans/CPDOC JB
"Um túnel ou um viaduto
leva anos para ser construído
no Rio, qualquer obra
se arrasta miseravelmente,
por falta de verba – e vamos
fazer uma cidade nova
nos confins do Judas."

Rubem Braga, contra a mudança


"Na Praça dos Três Poderes, o brasileiro
que não viajou nada, que não passou
do Méier, é atravessado pela certeza
fanática: a Praça de São Marcos não
chega aos pés da nossa."

Nelson Rodrigues
, a favor da mudança
Divulgação



O duelo dos sambistas
Acervo Pessoal
Eu não sou índio nem nada
Não tenho orelha furada
Nem uso argola pendurada no nariz
Não uso tanga de pena
E a minha pele é morena
Do sol da praia onde nasci
E me criei feliz
Não vou, não vou pra Brasília
Nem eu nem minha família
Mesmo que seja pra ficar cheio de grana
A vida não se compara
Mesmo difícil, tão cara
Eu caio duro mas fico em Copacabana

Billy Blanco, em Não Vou pra Brasília, contra a mudança


Trabalhador eu sei que sou
Me dê um palmo de terra, doutor
Garante a minha família que eu vou
Levo comigo Conceição e Dorotília
Violão e tamborim
Vou fazer samba em Brasília
Parto, saudoso do meu
Rio de Janeiro
Mas eu vou ficar famoso
Lá serei o primeiro

Ataulfo Alves, Samba em Brasília,
a favor da mudança
Acervo UH Folha Imagem

Que dia é hoje - Capital da República é transferida para Brasília

          Há exatas cinco décadas nossa querida São Sebastião do Rio de Janeiro deixava de ser a capital da república. Muita coisa mudou desde então, no país e no Rio. A transferência da capital fez muito bem para todo o Centro-Oeste, e hoje o eixo Goiânia-Anápolis-Brasília é um dos mais desenvolvidos do Brasil, e o primeiro da região central. As intenções de ter isolados o governo federal dos problemas locais de uma grande cidade foram atingidas, e até exageradamente, de certa forma, porque hoje sente-se o quanto Brasília fica afastada de tudo; as manifestações que eram comuns no Rio, são raras e de pouco efeito em Brasília.
          Com relação ao Rio, décadas de abandono e desordem fizeram com que a auto-estima da cidade e do seu povo fossem abaixo, porém, nos últimos anos, a cidade voltou a crescer e a receber vultuosos investimentos que reverteram o cenário decadente das décadas passadas, e o momento considerado como começo da recuperação de sua auto-estima foi o anúncio apoteótico e redentor de sua eleição como cidade-sede das Olímpiadas de 2016. O Rio hoje respira mais aliviado e mostra alguns bons quadros... para se ter uma idéia, o setor de serviços da cidade é um dos mais vibrantes da América Latina, o das telecomunicações é o mais competitivo (visto que é sede das Organizaçoes Globo e da Rede Record, por exemplo), e isto somado aos seus teatros, cinemas e eventos culturais, o que a tornam capital cultural do Brasil.  Também, curiosamente, mesmo após 50 anos, o Rio ainda concentra  maior número de servidores públicos federais que o próprio DF, em função de receber a ANP (Agência Nacional do Petróleo), ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e a Ancine (Agência Nacional do Cinema), além da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
          Neste século XXI, havemos de torcer para que as duas cidades rumem de encontro aos seus apogeus, tendo Brasília tomado um banho de moral livrando-se desta lama suja da corrupção e o Rio eliminado seus problemas relacionados à infra-estrutura, transportes, criminalidade e favelização, para que assim ambas possam dar de fato exemplos críveis para toda a nação de que muito é possível.

20 abril, 2010

Opiniões


Editorial "O Globo"

Em mais um lance da guerra de liminares, a Agência Nacional de Energia Elétrica foi forçada ontem a suspender o leilão da usina de Belo Monte, previsto para hoje. A batalha vai continuar entre advogados da União e organizações de ambientalistas, entre outras, que, por meio do Ministério Público, tratam de obter na Justiça liminares contra a hidrelétrica. Há muita mistificação e desinformação em torno de Belo Monte, um desafio mais audacioso do que a usina de Tucuruí, também no Pará, pois a hidrelétrica não contará com um grande reservatório, e uma parte significativa do investimento de R$ 19 bilhões estará voltada para iniciativas socioambientais.
Sem reservatório para regular a vazão de água que passará por suas turbinas, o projeto de Belo Monte terá de aproveitar ao máximo o curso do Rio Xingu, o que, pelo lado do meio ambiental, deveria ser visto como um ponto a favor da usina. A solução para Belo Monte alcançar o possível de sua potência foi desviar uma parte das águas do rio por dois canais adutores até a barragem principal, aproveitando-se a topografia da região. A construção de alguns diques possibilitará esse desvio.
Na prática, durante um certo trecho, o rio ficará dividido em dois, o que exigiu estudos sobre os efeitos socioambientais da redução do volume de água no antigo leito (assim com o impacto dos futuros canais). Em face desse expressivo desafio, a implantação de Belo Monte será acompanhada por olhares atentos não só dos paraenses, mas dos brasileiros de todos os cantos do país. A usina certamente despertará curiosidade no exterior e talvez venha a se transformar em atração turística internacional, assim como acontece hoje com o lago e a barragem de Itaipu.
A grandiosidade de Belo Monte pode ser percebida quando a usina é comparada com outros empreendimentos relevantes no setor elétrico. Belo Monte, nos momentos de baixa vazão do Xingu, pode gerar energia tanto quanto três usinas nucleares do tamanho de Angra 2 ou de quase uma centena de usinas eólicas. E, no período de cheia, com sua capacidade de produzir 11 mil MW, vai gerar mais energia do que Tucuruí, a parte brasileira de Itaipu ou das duas grandes usinas em construção, juntas, no Rio Madeira. Belo Monte estará próxima de importantes projetos de transformação e processamento de minérios (que dependem de boa oferta de energia) e das linhas de transmissão que já interligam os subsistemas Norte, Nordeste e Sul/Sudeste.
A legislação brasileira hoje exige que projetos da magnitude de Belo Monte arquem com o custo de compensações socioambientais.
Além disso, problemas e dificuldades enfrentados hoje pelas localidades na área de influência da futura usina estarão mais expostos, de modo que a população local passará a contar com poderoso aliado nas suas demandas, que é a opinião pública nacional. Só para citar um exemplo, a cidade de Altamira, sede de um dos maiores municípios brasileiros em extensão territorial, despeja todo seu esgoto, sem tratamento, nas águas do Rio Xingu, o que deixa os ribeirinhos sob permanente risco de saúde. As estradas da região são precárias, e a insuficiência de renda torna os moradores presas fáceis de atividades predatórias ao meio ambiente. Os benefícios da usina para a região, o Pará e o Brasil superam por larga margem eventuais transtornos causados pela obra. O empreendimento indispensável. 



Belo Monte, a tragédia ambiental
Artigo de Frei Beto
      
         Raoni, líder indígena, afirma que em 2007, ao receber a Medalha do Mérito Cultural das mãos do presidente Lula, este prometeu jamais assinar a construção da barragem de Belo Monte, no Xingu (PA).
         Está tudo pronto para que, em janeiro, ocorra o leilão da hidrelétrica a ser construída no rio Xingu. Uma das jóias da coroa do PAC. Falta apenas a licença ambiental do Ibama. Devido às pressões do Planalto para que o sinal verde seja dado o quanto antes, vários peritos do Ibama já pediram demissão.
         Sting, cantor britânico, esteve no Xingu na última semana de novembro para apoiar a rejeição a Belo Monte: “Sei que a obra faz sentido do ponto de vista econômico, mas do ponto de vista ecológico talvez não seja uma boa ideia”, declarou ele.
         Os povos indígenas do Xingu se queixam de não terem sido chamados a debater Belo Monte com o governo. O Brasil assinou a Convenção 69 da OIT, comprometendo-se a obter o consentimento prévio dos indígenas antes de tomar medidas que os afetem.
         Segundo especialistas, a construção de Belo Monte fará com que 3/4 da região, conhecida como Volta Grande do Xingu, sofram drástica escassez hídrica, perda de biodiversidade (que, ali, é uma das maiores do mundo), e efeitos sobre a população local, devido à redução do lençol freático, dos níveis de água e da vazão daquele trecho do rio.
         Imagens de satélite identificam Volta Grande: o rio Xingu corre para o norte, em direção ao Amazonas e, súbito, faz uma volta de quase 200 km, dando a impressão de retornar ao sul. Em seguida, retoma o rumo do norte, quase a fechar um anel completo. É um dos mais belos traçados fluviais do nosso planeta.
         Prevê-se a construção, na Volta Grande do Xingu, de três barragens de concreto, vários canais e cinco represas, alagando áreas que abrigam, hoje, agricultura, pecuária e inúmeros igarapés que abastecem a população local. Pretende-se escavar ali o mesmo volume de terra retirado para a construção do Canal de Panamá!
         Especialistas apontam que a obra é tecnicamente inviável, pois a potência instalada prevista, de 11.233 MW, só estará disponível durante três ou quatro meses do ano. O ganho de energia firme, de apenas 4.462 MW – 1/3 do total -, inviabiliza financeiramente o projeto.
Se ele for realizado, mais de 25 mil habitantes de Altamira, Transamazônica e das barrancas do Xingu serão obrigados a se mudar, condenados a uma pobreza ainda maior.
         O contribuinte brasileiro é quem pagará, através de financiamentos do BNDES e da participação de estatais, boa parte dos custos desta empreitada de efeitos devastadores. Empresas como Chesf, Eletronorte, Furnas e Eletrosul, poderão entrar juntas ou isoladamente no leilão para a construção de Belo Monte. Assim, o contribuinte irá financiar o lucro imediato de empreiteiras, e o lucro a longo prazo das empresas mineradoras que atuam na Amazônia, as grandes beneficiárias de Belo Monte. De quebra, a nação brasileira arcará com os custos ambientais.
         Lula concedeu, este ano, duas audiências ao bispo do Xingu, dom Erwin Kräutler, a quem prometeu que Belo Monte “não será imposta goela abaixo.” Em carta ao presidente, o bispo frisou que, a ser construída apenas a usina Belo Monte, é um despropósito técnico assegurar a potência prevista no projeto. A potência almejada pelos técnicos da Eletrobrás só sera alcançada se forem construídas outras três usinas rio acima (Altamira, Pombal e São Félix). Neste caso, os grandes reservatórios atingirão outros territórios indígenas demarcados e homologados, e áreas de conservação ambiental. Quem vive da pesca e da agricultura familiar perderá a base de sua subsistência.
         A população a ser atingida está sendo subestimada, e as empresas e o BNDES não sabem quanto irão desembolsar para amenizar o impacto social. Ora, quem já viu uma empresa dessas deixar-se guiar por um espírito altruísta, solidarizando-se com os pobres e, em seguida, esmerando-se na promoção de obras para mitigar a miséria das famílias atingidas?
         A região de Volta Grande do Xingu ficará praticamente seca com a construção da usina. A exemplo do que aconteceu com a cachoeira de Sete Quedas na construção da usina de Itaipu, também Belo Monte modificará 100 km de uma sucessão de cachoeiras, corredeiras e canais naturais.
         A obra atrairá intenso fluxo migratório no rumo de Altamira, Vitória do Xingu, Brasil Novo, Anapu e Senador José Porfírio. Esses municípios não dispõem da infraestrutura necessária, nem contam com escolas e hospitais suficientes para atender a tanta gente.
         O projeto promete assegurar qualidade de vida apenas para quem trabalhar nas obras de construção da usina. A população restante, cinco vezes maior, ficará na miséria, exposta à criminalidade e agredida pelos antros de narcotráfico e prostituição.
         Quanto vai custar a obra? O próprio presidente da Eletrobrás fala em variações de um 1 a 3 mil dólares o quilowatt instalado, o que significa um total de US$ 33 bilhões, ou R$ 60 bilhões para uma usina que ficará parada várias meses durante o ano.
         A tarifa de energia elétrica ficará extremamente alta. Pior será obrigar o Tesouro Nacional a subsidiar a energia gerada. Neste caso, serão penalizados mais uma vez a cidadã e o cidadão brasileiros.
 
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